domingo, 27 de setembro de 2009

The magic bullet

Entre as muitas teorias acerca do assassinato de John Kennedy, uma chamou atenção por absolutamente inverossímil, por ser inacreditável ao limite do ridículo. Era a teoria segundo a qual um atirador sozinho teria feito um único disparo. A mesma bala teria causado, através de múltiplos ricocheteios, os ferimentos encontrados em Kennedy e no governador do Texas, John Connally, que o acompanhava. Era o teoria da magic bullet, ou bala mágica.
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Atire a primeira pedra ou faça o primeiro disparo de rifle aquele que nunca sonhou em encontrar-se com a sua bala mágica. A bala redentora, que liberta de todas as mazelas de um mundo corrompido ao qual não conseguimos nos adaptar. Um mundo no qual não cabemos, com nossos sonhos e inquietações.
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O conhaque que desce em goles profundos conforta e anestesia. E adia o meu encontro com a bala mágica. Mas não impede que eu possa me encontrar com as muitas que voam por aí, tão desnorteadas quanto as pessoas que as disparam. Somos infelizes, sem escapatória, escravizados pelo medo de morrer, e pelo medo de viver, medos frustrantes e incapacitantes em igual medida.
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Que venham as balas mágicas. A minha ou a sua.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Não tão vasto mundo

O trabalho transforma o mundo. Nesse exato momento, ele transforma o meu mundo, reduzindo-o ao mínimo de suas potencialidades, que são o máximo que eu posso extrair depois de um dia de trabalho árduo. Um trabalho que me exaure ao ponto de incapacitar-me para a plena fruição do que a vida possa me oferecer. Um trabalho que, ao fim do dia, não me deixa energia para muito mais que um apertar de botões do controle remoto.
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Meus horizontes não abrangem mais do que três ou quatro pequenas compensações. O idealista que sonhava em aprimorar-se nos estudos, engajar-se num trabalho voluntário ou passar mais tempo com família contenta-se com um rosário de pequenos prazeres, tão escassos quanto irrelevantes. Um programa de auditório na TV, uma lata de cerveja, uma refeição gordurosa ou uma rápida olhada nos gols da rodada.
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Quem já sonhou em viver grandes paixões contenta-se com olhadas furtivas nos seios fartos de sua cunhada, imaginando como seria sugar aqueles mamilos grossos, eriçados ao toque da língua. Quem almejava uma carreira profissional ascendente e meteórica dá-se por satisfeito em pagar as contas ver sobrar alguns tostões no fim do mês. Quem se imaginava com potencial para fazer revoluções e mudar o mundo não quer mais do que um micro-universo doméstico ordenado, com mulher, filhos, trabalho e igreja.
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O trabalho tem diminuído bastante minha vida e meus horizontes. Tenho dúvidas se ainda caibo neles.