domingo, 23 de novembro de 2008

Mudança de vida

Você já não agüenta mais, vai gozar a qualquer minuto. Já segura a esporrada a duras penas só para prolongar a visão que tem nesse momento. Dessa boca carnuda, orlada por lábios grossos, fazendo um boquete caprichado com sons de estalo e gemidinhos abafados.
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E pensar que essa mesma boca faz as leituras da missa com pontuação e entonação perfeitas. Essa boca beija o rosto do marido cansado do trabalho e as crianças antes de dormir. Essa mesma boca faz biquinho para ver se a sopinha estava boa de sal e dá um sorrisinho envergonhado cada vez que ouve uma piada suja. É essa boca que parece que vai tragar o seu pau naquele momento, com uma chupada furiosa, como se ela quisesse arrancar a força a porra dos seus testículos.
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Você não agüenta mais, sem saber se é por essas lembranças ou pela chupada deliciosa que essa senhora respeitável de boca carnuda lhe aplica nesse momento. O leite jorra pela garganta da chupadora e você sente as forças o deixarem. E se depara com a visão mais linda do mundo.
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É a visão da senhora respeitável, mãe amorosa e esposa dedicada e religiosa totalmente aos seus pés. Descomposta, desgrenhada, com porra a lhe escorrer pelo queixo, irreconhecível a seus amigos e familiares.
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Você a submeteu. Escravizou-a, corrompeu-a e desencaminhou-a. Tornou a numa puta dissimulada que mente ao marido e aos filhos para ir se encontrar com você. Ela se perdeu e se rebaixou por completo e ainda lhe é grata por isso. Pra você, um orgulho tão prazeroso quanto a esporrada que deu naquela boca carnuda há poucos segundos.Você mudou a vida de uma pessoa. E ninguém nem lhe dá os parabéns.

sábado, 15 de novembro de 2008

O mundo claro e o mundo escuro

O calor me deprime. Me deprime, me cansa e me exaspera, enchendo a minha casa de uma claridade que eu não quero e não posso suportar. Depois de duas noites sem dormir, me alimentando apenas de cigarro e conhaque, a claridade do sol que nasce é um tapa na cara, um soco nos meus olhos inchados emoldurados por olheiras escuras. Ela dói fisicamente, me causando um incômodo tão intenso que eu corro a fechar as janelas, com o desespero de um vampiro prestes a se desmanchar com as luzes da aurora.
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Momentaneamente eu retomo a escuridão, símbolo da paz do meu mundo subterrâneo. O mundo onde os meus escritos são apreciados, onde meus pontos de vista são compreendidos, onde minha cultura é respeitada e valorizada. Um mundo onde meu gosto musical refinado não é motivo de piada ou de estranhamento. Neste mundo, eu não tenho um xucro, um completo ignorante, me dando ordens e as mulheres se perfumam com o objetivo único de me seduzir.
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Tentadora é a possibilidade de adentrar esse mundo e não retornar jamais. De não ser mais obrigado a enfrentar o mundo real, que tanto ri das minhas inquietações e me expõe a essa luz dilacerante que tenta invadir meu refúgio ao nascer do dia.
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O apertar de um gatilho, um último vôo desesperado de uma janela do último andar, muitas são as possibilidades de adentrar esse mundo escuro e mágico. A coragem ainda me falta, mas o mundo real anda se empenhando muito em me encorajar. Qualquer dia ele consegue.