sábado, 15 de novembro de 2008

O mundo claro e o mundo escuro

O calor me deprime. Me deprime, me cansa e me exaspera, enchendo a minha casa de uma claridade que eu não quero e não posso suportar. Depois de duas noites sem dormir, me alimentando apenas de cigarro e conhaque, a claridade do sol que nasce é um tapa na cara, um soco nos meus olhos inchados emoldurados por olheiras escuras. Ela dói fisicamente, me causando um incômodo tão intenso que eu corro a fechar as janelas, com o desespero de um vampiro prestes a se desmanchar com as luzes da aurora.
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Momentaneamente eu retomo a escuridão, símbolo da paz do meu mundo subterrâneo. O mundo onde os meus escritos são apreciados, onde meus pontos de vista são compreendidos, onde minha cultura é respeitada e valorizada. Um mundo onde meu gosto musical refinado não é motivo de piada ou de estranhamento. Neste mundo, eu não tenho um xucro, um completo ignorante, me dando ordens e as mulheres se perfumam com o objetivo único de me seduzir.
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Tentadora é a possibilidade de adentrar esse mundo e não retornar jamais. De não ser mais obrigado a enfrentar o mundo real, que tanto ri das minhas inquietações e me expõe a essa luz dilacerante que tenta invadir meu refúgio ao nascer do dia.
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O apertar de um gatilho, um último vôo desesperado de uma janela do último andar, muitas são as possibilidades de adentrar esse mundo escuro e mágico. A coragem ainda me falta, mas o mundo real anda se empenhando muito em me encorajar. Qualquer dia ele consegue.

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